Vitória/ES – O advogado e ativista dos direitos humanos em Vitória, Espírito Santo, André Luiz Moreira, que também é músico nas horas vagas, reagiu com a letra de um rap, a violência ao garoto negro de 15 anos, encontrado nu, espancado e amarrado a um poste por uma trava de bicicleta, no Flamengo, Rio, segundo consta por um grupo de “justiceiros” formado por jovens da classe média branca carioca.
A letra desafia a barbárie da agressão: “Quero ver tu colocar a mão em mim/Eu to aqui no desespero/É que lá no Rio de Janeiro/amarraram uma cara no/Pelourim/Tava pelado/Reduzido à condição de escravo/Com olho de bicho encurralado/Moleque acuado/Mas isso não vai ficar barato/Isso não vai ficar assim”, começa.
Moreira disse que fez a letra indignado com o episódio que, segundo ele, é recorrente no Rio e nas grandes cidades brasileiras, em que aos poucos está se naturalizando a violência contra os vulneráveis – em especial, negros e pobres.
Velhas práticas
Ele lembra que ao amarrarem o garoto num poste com uma trava de bicicleta e o deixarem exposto nu, após o espancamento, os agressores repetiram velhas práticas de castigos contra negros muito comuns durante o período da escravidão. “É inacreditável que quase 126 anos depois da Abolição, estejamos assistindo em pleno século XXI, essas cenas”, reagiu.
A idéia dele é que a letra seja usada por rappers que quiserem botar música e construir os arranjos. Nos próximos dias, por meio de amigos, a letra chegará ao líder dos Racionais MC’s Mano Brown, a quem Moreira pediu que analise com carinho a hipótese de um arranjo.
“É preciso que a sociedade reaja a tendência que está muito presente desse tipo de violência se banalizar e se naturalizar”, afirmou.
Estúdio
O primeiro resultado da atitude do advogado e ativista já aconteceu: a Afropress decidiu promover um concurso para o melhor arranjo da letra aos rappers de todo o Brasil e garantirá um dia de estúdio em S. Paulo para a gravação. A escolha do melhor arranjo será feita pelo autor da letra e por rappers e ativistas convidados.
Os interessados devem fazer contato com a Redação de Afropress – redaçã[email protected], ou com o próprio autor por meio do e-mail: [email protected].br
ACUADOS
Eu sô neguim
Quero ver tu colocar a mão em mim
Eu to aqui no desespero
É que lá no Rio de Janeiro,
amarraram uma cara no Pelourim
Tava pelado
Reduzido à condição de escravo
Com olho de bicho encurralado
Moleque acuado
Mas isso não vai ficar barato
Isso não vai ficar assim
Vou fazer um trato
É que comigo não tem treta
Porque eu já sei qual é o signo
do capeta
Vai ser na mão, na faca ou na
beretta?
Na boca do bueiro, na sarjeta
É que eu vou cobrar cada centavo
Dos 500 anos de trabalho escravo
Vai ser aí meu desgravo
Quero ver tu ficar bravo
Não foge não!
Aí riquim
Não vem com seu ódio contra mim
Vai ter que aprender a dividir, sim
Se vier, vem na de Caim,
Senão, vão saber que eu tô afim.
Pois é assim que eu vivo,
eu sobrevivo,
contra maré, eu contravim,
Saí do céu, fui pro inferno.
E você não sabe nada do modelo
do meu terno
Porque Eu sô neguim
Quero ver tu colocar a mão em mim
Eu tô no osso
Mas num bairro da Zona Sul do Rio
de Janeiro, Naquele fosso
Amarraram o cara pelo pescoço
Foi só desgosto
Mas isso não vai ficar assim
bicho ruim
Comigo não tem treta
Porque eu já sei qual é o signo
do capeta
Vai ser na mão, na moral
ou escopeta?
Na boca, no bueiro, na sarjeta
Que eu vou cobrar cada centavo
Dos 500 anos de trabalho escravo
Vai ser aí meu desgravo
Aí eu quero ver tu ficar bravo
Porque eu sou neguim
Da Redação