S. Paulo – A Igreja da Boa Morte será o ponto de partida da 18ª Marcha Noturna pela Democracia Racial, promovida por cerca de 40 entidades dos movimentos negro e popular, com apoio do SOS Racismo e da Comissão da Verdade "Rubens Paiva", da Assembléia Legislativa de S. Paulo.
A Marcha, que acontece no dia 12 de maio – véspera da data em que o Brasil lembra os 126 anos de Abolição – este ano passará por lugares marcantes na história da escravidão negra em S. Paulo. A concentração vai acontecer a partir das 15h, em frente à Igreja que fica na Rua do Carmo, Praça da Sé, próximo ao Poupatempo.
A edição deste ano lembra os “514 anos de tortura e genocídio das populações negra, pobre e periférica e os 50 anos do golpe militar”. A Igreja foi escolhida por ser historicamente conhecida como o local onde os escravos “rebeldes” e condenados recebiam as últimas bênçãos antes de serem executados.
No dia 13, a partir ds 16h, a Comissão da Verdade, presidida pelo deputado Adriano Diogo (PT), promove no Plenário Franco Montoro da Assembléia Legislativa, audiência pública com o tema "O Negro na Ditadura", para ouvir relatos de violação de direitos humanos de lideranças negras durante o regime militar.
Os manifestantes seguirão até a Praça João Mendes onde fica a Igreja de Nossa Senhora dos Remédios, construída em 1.727, que servia de ponto de encontro de abolicionistas como José do Patrocínio, Luiz Gama e Antonio Bento. No local da Igreja foi construído o Fórum João Mendes e, próximo ao Fórum, pode-se ver o Largo Sete de Setembro, antigo Largo do Pelourinho, instalado no início do século XIX, entre a Rua da Glória e a Rua da Força – atual Avenida da Liberdade.
Em seguida a Marcha segue pela Praça da Sé – onde havia um Pelourinho instalado no século XVII, e Largo São Francisco, onde está a Faculdade de Direito da USP, descendo a Rua S. Bento e chegando à Praça Antonio Prado na esquina com a Rua 15 de Novembro – antiga Rua do Rosário dos Homens Pretos.
O trajeto da manifestação seguirá pela Líbero Badaró, Viaduto do Chá e Praça Ramos, onde está o Teatro Municipal, em cujas escadarias nasceu o Movimento Negro Unificado contra a Discriminação, em 1.978.
Em seguida os manifestantes seguirão pela Rua Conselheiro Crispiniano chegando ao fim ao Largo do Paysandu, onde está a Igreja do Rosário dos Homens Pretos.
Confira o texto do Manifesto lançado pelas entidades que organizam a 18ª Marcha pela Democracia Racial no Brasil
PORQUE MARCHAMOS HOJE
514 anos de Tortura e Genocídio da população negra, pobre e periférica aos 50 anos do golpe militar
CONTRA O GENOCÍDIO DA POPULAÇÃO NEGRA – Pelo fim dos autos de resistência e pela desmilitarização da Polícia
Há exatos 126 anos, o Brasil proclamou a abolição da escravidão. Uma abolição, entretanto, inacabada porque o Estado brasileiro não criou mecanismos de inserção social dos afrodescendentes na sociedade brasileira. Pior. Manteve intactos e têm sistematicamente atualizado os instrumentos de segregação, exclusão e extermínio da população negra. As elites acadêmicas do século XIX defendiam uma nação “branca” como condição para se desenvolver. Depois disto, disseminou pelo país afora mito da “democracia racial”, a partir dos escritos de Gilberto Freire. Mito este que foi desmontado com a ação do movimento negro que denunciou os mecanismos sistêmicos e não sistêmicos de opressão racista.
Nos últimos anos, o movimento negro avançou, apesar da sub-representação nos espaços de poder e de decisão que se constituiu num elemento importante para manutenção da população na marginalidade. Vem exigindo políticas públicas de combate ao racismo, tanto de caráter geral como específicas. E com algumas vitórias, com a aprovação da Lei 10639/03, as cotas nas universidades federais, ações afirmativas na preparação para o processo seletivo do Instituto Rio Branco e cotas em alguns concursos públicos. Além disto, diversas políticas públicas na área de saúde e educação têm sido implantadas com corte racial.
Apesar disto, mecanismos de opressão racista persistem e ameaçam a vida de negros e negras. Cinquenta anos após o golpe de 1964, a forma que foi realizada a transição da ditadura para a democracia deixou presente na sociedade brasileira instituições autoritárias em que a prática sistemática da violência e desrespeito dos direitos humanos tem sido a tônica. Bairros de periferia vivem em estados de sítio permanentes, com a imposição de toques de recolher, abusos de autoridade frequentes, desrespeito a direitos fundamentais e execuções extrajudiciais. A prática da tortura física e psicológica ainda acontece em delegacias. A justiça continua lenta, elitista e pouco preocupada em atender as demandas dos cidadãos da periferia.
Episódios como o desaparecimento de Amarildo, as execuções do DJ Lah, do menino Douglas, o caso da trabalhadora Cláudia que teve o seu corpo arrastado em uma viatura policial no Rio de Janeiro e vários outros casos que costumeiramente são justificados pela Polícia como “resistências à ação policial seguidas de morte”. Os aparelhos repressivos atuais repetem os mesmos requintes do período da ditadura militar e se voltam contra jovens negros e negras, trabalhadores, moradores da periferia.
Tudo isto mais os indicadores que mostram que o assassinato de jovens negros cresceu 23,4% enquanto que entre os brancos houve queda de 27,5% sinalizam para a existência no Brasil de um genocídio da população negra.
Por isto, a nossa bandeira é PELA DESMILITARIZAÇÃO DA POLÍCIA (previsto pelo Projeto de Emenda Constitucional 51/12) e PELO FIM DOS AUTOS DE RESISTÊNCIA (previsto no Projeto de Lei 4771/12).
Assim, nesta Marcha Noturna, 126 anos após a abolição inacabada, as entidades do movimento negro de São Paulo clamam:
ONDE ESTÁ AMARILDO?
POR QUE O SENHOR ATIROU EM MIM?
SOMOS NEGRAS!
SOMOS CLÁUDIAS!
PELA APROVAÇÃO DO PL 4771/12 E DA PEC 51/12
Da Redacao